Um anúncio recente, feito pelo Instituto de Oceanologia do Mar da China Meridional da Academia Chinesa de Ciências, anunciou a construção do Centro de Pesquisa de Ecossistemas de Infiltrações Frias. Trata-se de uma espécie de estação espacial com três módulos, porém instalada no fundo do oceano, a uma profundidade de dois mil metros.
Implantada após anos de debate e estudos técnicos, a estação servirá a vários propósitos. Além de explorar uma poderosa fonte inédita de energia, pretende descobrir novas espécies de vida marinha e pesquisar outras formas de riqueza mineral. Ao aumentar o poder geopolítico de Pequim, a instalação também adicionará mais uma dimensão profunda às já complexas disputas territoriais marítimas na região.
Considerado uma das instalações subaquáticas mais profundas e tecnologicamente complexas já tentadas até hoje, o laboratório está programado para iniciar suas operações por volta de 2030, com espaço para seis cientistas. As missões das equipes irão durar até um mês. Os participantes já apelidaram o local de “estação espacial de águas profundas”.
Por que a China está instalando uma estação de pesquisa no fundo do mar?

Como indicado no nome do centro de pesquisas, o principal objetivo do programa chinês é explorar os sistemas de infiltrações frias. Esses fenômenos oceanográficos ocorrem quando massas de água fria se movem para áreas normalmente ocupadas por águas mais quentes. Esses fluxos são ricos em hidrocarbonetos, como metano e sulfeto de hidrogênio, que vazam de rachaduras no fundo do mar devido à atividade geológica ou mudanças de pressão.
Nessas regiões, bactérias e arqueias utilizam compostos químicos presentes nos fluidos para gerar energia através da quimiossíntese, sem necessidade de luz solar. Esses microrganismos formam a base da cadeia alimentar de ecossistemas adaptados, que incluem moluscos, crustáceos e vermes tubícolas, capazes de viver em condições extremas de alta pressão e baixos níveis de oxigênio.
Logicamente, a biodiversidade é só um elemento atraente dentro de um plano bem mais ambicioso. É que, na verdade, as infiltrações profundas emanam de fontes hidrotermais ricas em metano que, além de formas de vida únicas, escondem vastos depósitos de hidratos, também conhecidos como gelo inflamável.
O que é o gelo inflamável do fundo do mar da China?

O próprio líder do projeto, Li Chaolun, diretor do Instituto de Oceanologia do Mar da China Meridional e líder do projeto, reconhece que “não se trata apenas de ciência”, e explica ao China Daily: "As infiltrações frias são as chaves para entender o ciclo de carbono da Terra, a vida em ambientes extremos e a extração segura de recursos como hidratos de metano”.
O hidrato de metano é um composto de inclusão, ou seja, uma molécula (no caso o metano) fica aprisionada dentro da estrutura de outra (gelo de água), sem formar uma ligação química tradicional entre elas. Na prática, o hidrato de metano é um gelo que pega fogo. Apesar de formado por água congelada, ele libera metano quando aquecido ou despressurizado, que faz o gelo queimar, mesmo parecendo sólido.
Essa propriedade dá ao composto um potencial energético incalculável. Estima-se que os depósitos globais contenham mais carbono do que todas as reservas conhecidas de carvão, petróleo e gás natural combinadas. Embora considerado uma possível fonte de energia estratégica, pois libera 50% menos emissões de carbono do que o carvão, o metano tem um efeito estufa 80 vezes mais potente do que o CO2.
Como os cientistas conseguirão sobreviver no fundo do oceano?

Instalada em condições mais hostis do que a própria ISS, a "estação espacial do fundo do mar" terá que garantir a sobrevivência de seis cientistas por até um mês dentro de uma estrutura localizada a mais de 1,6 mil metros abaixo da superfície. Com condições de pressão 200 vezes maior que ao nível do mar e total ausência de luz, a estação precisará de um sistema de suporte de vida eficiente.
Isso requer uma rede de monitoramento contínuo para acompanhar movimentos de metano, dados ecológicos e atividade tectônica em zonas de infiltração fria. Nessas áreas, a atividade tectônica faz com que petróleo e metano escorram do fundo marinho, criando vazamentos nas rachaduras submarinas, que se espalham por grandes distâncias, afetando ecossistemas e processos geológicos.
O projeto será integrado a um sistema de monitoramento "quadridimensional", pois inclui também submersíveis não tripulados, observatórios submarinos e o navio de perfuração Mengxiang. A broca desse navio foi projetada para alcançar o manto terrestre, a 11 mil metros abaixo do Mar da China Meridional. O objetivo é estudar climas antigos, vida microbiana e melhorar a previsão de terremotos e tsunamis na região.
Mergulhe conosco nessa experiência inovadora e compartilhe suas impressões nas redes sociais. Conheça a expedição no fundo do mar que descobriu mais de 100 novas espécies.
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